Para quem não gosta da nossa agricultura
COLUNISTA - Helio Casale
Os veículos midiáticos, principalmente a televisão, que tem alcance nacional, têm usado e
abusado da arte de destratar nossa agricultura convencional, divulgando notícias inverídicas,
sem se preocupar com as consequências de tais atitudes. Essas informações são multiplicadas
com sabor de vitória por profissionais de pouco conhecimento e que não gostam da pesquisa.
Difícil saber quanto é ignorância, má-fé ou burrice.
Programas dominicais são assistidos e comentados por milhões de brasileiros. Na
apresentação dos temas, chama atenção a valorização dos produtos e produtores orgânicos,
enquanto taxam os alimentos convencionais como carregados de venenos que fazem mal à
saúde. Respeitados repórteres fazem tais afirmações sem se darem ao trabalho de confirmar a
realidade. Deveriam ter como missão levar ao conhecimento do público mensagens sérias e
que refletissem a realidade.
A palavra agrotóxico é empregada com grande frequência nesses programas.
Etimologicamente, agrotóxico seria produto tóxico para a agricultura. Na realidade, o que se
emprega em nossa agricultura são defensivos para o controle de pragas e doenças e que,
empregados na dose certa, na hora certa, não causam danos às plantas nem ao meio
ambiente.
Tais produtos são avaliados por técnicos do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, Ministério da Saúde, Ministério do Meio Ambiente, Anvisa em processo que
dura mais ou menos dez anos. São avaliadas características químicas, físicas, biológicas e os
eventuais resíduos tóxicos para animais e humanos. Passam por um verdadeiro pente fino.
Chamar esses produtos de tóxicos para a agricultura é não reconhecer o trabalho dos técnicos
envolvidos em cada processo de registro, não reconhecer o valor das indústrias que gastam
milhões em pesquisas para lançar uma nova molécula e dar uma informação inverídica aos
ouvintes. Informação falsa na base da "achologia".
Dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e do Banco
Mundial mostram o consumo de defensivos por habitante, por ano, em diversos países. No
Japão, 11,5kg; Holanda, 4.5 kg; França, 2,4 kg; Alemanha, 1,9 kg; e Brasil, 1,16 kg. Esse númerO se deve ao fato de sermos um país tropical onde se pode fazer diferentes cultivos, num mesmo solo de 2 a 2,5 vezes por ano. Por aqui não temos neve, nem frio intenso, que iniba o
desenvolvimento das plantas.
Gostaria que os profissionais da mídia televisiva levassem sementes de soja transgênica e de
soja orgânica para análise completa de macros, micronutrientes e resíduos de agroquímicos
contidos em cada uma delas. Podem ser sementes de feijão, carne bovina, leite, cenoura,
chuchu. Tal apelo vale também aos ecologistas de plantão. De posse desses resultados, tomar
a verdadeira posição sem qualquer paixão ideológica, sem "achologismo".
O esterco de frangos ou de galinhas poedeiras, quando aplicado num cultivo chamado de
orgânico, será que as aves comeram apenas produtos orgânicos? Um franguinho caipira vai
para a panela aos seis meses e um de granja, com pouco mais de 20 dias. A diferença é a ração
balanceada, sem minhocas, sem sementinhas, sem insetos, entre outros.
Vale lembrar que as plantas bebem os nutrientes essenciais somente na forma mineral, pois
não existe nutrientes orgânico. Se assim fosse, o que seria dos produtos produzidos com
hidroponia, em que a alimentação das plantas é feita somente com os nutrientes devidamente
balanceados dissolvidos em água filtrada? Atrás dos resultados tem muita ciência que deve ser
valorizada e respeitada.
No Brasil, somos mais de 200 milhões. Na China, onde se praticava agricultura orgânica no pós-
guerra mundial, morreram cerca de 15 milhões de chineses por falta de comida, ou seja, de
fome. Já a China de hoje se beneficiou da descoberta da amônia por Haber e fertilizando seus
campos, está fazendo comida mais abundante, rica e barata. Acabou a fome.
Por outro lado, mesmo comendo os chamados agrotóxicos, nossa expectativa de vida atual
passa dos 72 anos, praticamente semelhante à de países desenvolvidos. Ao invés de condenar
tais produtos, deveríamos dar graças por vivermos mais uns aninhos.
Ficar "achologicamente" contra os defensivos, os fertilizantes minerais, é desconhecer sua
importância, é trabalhar contra a ciência, é trabalhar por dias piores, dias do "quanto pior,
melhor".
*Hélio Casale é engenheiro agrônomo, formado pela ESALQ (1961), consultor especializado em
fertilidade do solo e nutrição de plantas e cafeicultor.