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Crianças, não cresçam, é uma cilada

Kallil Dib

  • 24/06/15
  • 14:00
  • Atualizado há 457 semanas

Pequenos, não cresçam. Chamem a mãe para se limpar, dancem com a Xuxa, riam do Didi, caiam, batam a cabeça, tomem chuva e brinquem na enxurrada, engulam uma tampinha de caneta. Isso faz bem. Não queiram crescer, é chato, e dá uma saudade da mamadeira.

Me lembro bem dos tempos de criança, da vontade louca que eu tinha de crescer, me tornar independente, escolher minha própria roupa, pagar as minhas contas, não me preocupar com a matemática da escola. Mal sabia que aquele era o momento da felicidade, dos sonhos, da inocência. Foi preciso crescer para perceber o tempo que perdi imaginando a minha vida de gigante.

Como era bom escrever cartinhas de três linhas ao Papai Noel, fazer uma casinha aconchegante ao Coelhinho da Páscoa, torcer para que a Fada dos Dentes viesse me visitar à noite, e ter medo do Lobo Mau da Chapeuzinho Vermelho.



Ah, que tempo bom aquele das bolinhas de gude, da pipa voando ao eterno, do futebol no meio da rua de terra, do amor de criança, da felicidade, do sincero. Problemas existiam apenas para quem podia resolvê-los. Eu? Ficava feliz quando ganhava um saco de pipocas no sábado à noite.

Pois é, cresci, e caí numa cilada. Pensei que tudo seria diferente. Imaginava que os grandes eram independentes e cuidavam de si mesmos sem se preocupar com o mundo à sua volta, teriam dinheiro de sobra, e não existiriam outras obrigações, a não ser cuidar de seus filhos. Que decepção.

As obrigações do mundo adulto são tão incoerentes que nem as felicidades da vida eles, os adultos, conhecem. Passam o resto de seus dias trabalhando, estudando, pagando contas, fazendo contas... E as crianças? Ah, que inveja delas. Apenas se atentam ao jogo de vídeo game no fim da tarde.

Até o amor, que é amor, o sentimento mais sincero e fascinante deste universo, as crianças conhecem mais. De maneira inocente conseguem amar o próximo sem pensar na razão, apenas seguem sua emoção de anjo, e fazem do mundo um motivo tão simples para arrancar o sorriso mais sincero.

Por isso, dou uma dica aos pequenos sonhadores: não queiram crescer. Insistam à fada madrinha, ao amigo imaginário, falem com Deus ou com o seu super-herói favorito. Façam de tudo para que o tempo não passe. Nem que seja nos seus sonhos.

Crescer é uma cilada. Uma arapuca sem volta.

O que fica é apenas a saudade de um dia ter sido um pequeno inocente.

KALLIL DIB - jornalista

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